Agosto Lilás: TRT-MA discute sobre o papel da mulher na sociedade e as formas de violência
O papel feminino nas estruturas sociais ao longo dos séculos, a busca pela igualdade e liberdade de atuação do gênero feminino e a conscientização pelo fim da violência contra a mulher foram os assuntos debatidos durante a palestra “A proteção à mulher no ano de 2022: a delicada balança entre vulnerabilidade e empoderamento”, ministrada pela professora e doutora em Direito, Bruna Barbieri Waquim, na manhã de terça-feira (30/8), no Auditório da Escola Judicial do Tribunal Regional do Trabalho da 16ª Região (MA). O evento faz parte das ações em alusão ao Agosto Lilás – mês de enfrentamento à violência contra mulher – e foi promovido pela Comissão de Incentivo à Participação Institucional Feminina do TRT-MA, que tem como coordenadora e coordenadora substituta, respectivamente, a desembargadora e diretora da Escola Judicial, Márcia Andrea Farias da Silva, e a juíza titular da Vara do Trabalho de Barreirinhas, Liliana Maria Ferreira Soares Bouéres.
Ao abrir a palestra, a juíza Liliana Bouéres compartilhou dados referentes aos casos de feminicídio no Brasil. Segundo ela, no país, a cada 7 horas, uma mulher morre vítima de violência, o que significa dizer que, pelo menos 3 mulheres morrem por dia vítimas de feminicídio. A juíza também falou da importância da campanha Agosto Lilás e da Lei Maria da Penha (Lei n° 11.340 de 7 de agosto de 2006), além de enfatizar a presença da discriminação no ambiente de trabalho. “As mulheres são as grandes vítimas do assédio sexual e moral, além de terem os salários mais baixos mesmo quando exercem as mesmas funções que os homens e têm mais dificuldade em alcançar as almejadas promoções profissionais na ocupação de cargos de chefia, assessoramento ou diretoria”, afirmou ela.
A magistrada também falou do marco histórico que foi a garantia do direito ao voto no Brasil, assegurado a todas as mulheres no ano de 1934, mas destacou que a conquista se deu apenas há menos de cem anos atrás. Ela citou ainda os avanços no combate à violência contra a mulher no que diz respeito ao amparo do tema pela Justiça, a exemplo da Campanha Sinal Vermelho, idealizada pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) e pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), e da tipificação do crime de feminicídio no Código Penal.
Na sequência, a doutora Bruna Waquim iniciou a palestra prometendo trazer o tema sob uma perspectiva diferente, trabalhando as raízes do papel social feminino. A palestrante apresentou um panorama histórico do conceito de mulher desde a pré-história, passando pela antiguidade clássica até o atual momento. Segundo ela, a própria ideia do “ser mulher” é algo que está em constante construção e que tem muita influência de aspectos culturais. A professora também perpassa por questões relativas aos estereótipos femininos e chama atenção para como eles acabam sendo produtores de violências, além de destacar a atuação da mulher na vida profissional e tratar sobre o conceito de trabalho reprodutivo, que é o tipo de trabalho realizado pela mulher e necessário tanto para o sustento da vida e a sobrevivência na esfera doméstica quanto para a reprodução da raça humana.
Bruna Waquim destacou como a lente discriminatória com que a mulher foi vista desde os tempos mais antigos serviu para construir as ideias sobre o gênero feminino que perpetuam na sociedade até hoje, frisando também a privação de direitos e os conceitos históricos que enxergavam a mulher como “homem inferior” e fraca de espírito. “A cada momento histórico, um novo discurso acaba justificando a inferiorização e submissão da mulher”, explicou ela.
A mulher no mercado de trabalho também foi foco da palestra. A professora explicou que, diferentemente do que as pessoas pensam, as mulheres não se tornaram participantes da vida profissional apenas a partir da Revolução Industrial, na verdade “a mulher sempre prestou trabalho, só que ele não era remunerado”. De acordo com dados apresentados pela palestrante, ainda hoje a mulher precisa enfrentar desigualdades no mercado de trabalho e na educação, dispondo de menos tempo para se dedicar aos estudos ou atividades laborais, sobretudo por causa do acúmulo de tarefas domésticas.
Ela tratou sobre o conceito de trabalho reprodutivo, que é o trabalho doméstico não remunerado, apresentando uma distinção clara entre essa definição e o já conhecido trabalho produtivo, que se refere a toda e qualquer atividade profissional remunerada. Segundo ela “trabalho reprodutivo é algo que a gente precisa começar a discutir porque tem muitos impactos, e um desses impactos acaba sendo a subalternização da mulher que, quanto menos tempo, capacidade e energia tiver para exercer o trabalho fora de casa, o ciclo de submissão e dependência econômica continuará sendo mantido”. A grande problemática, destaca ela, é que essa desvalorização do trabalho reprodutivo é considerado inativo dentro das estatísticas oficiais do trabalho, porém, representa 15% do PIB brasileiro.
Por fim, foi apresentado o ciclo de violência contra a mulher e algumas das tipificações dessa violência. Bruna prestou esclarecimentos acerca do comportamento de omissão da vítima, que muitas vezes perpetua-se por ser fortalecido por uma crença na mudança de mentalidade do agressor.
Ela encerrou sua fala proporcionando uma reflexão sobre vulnerabilidade e empoderamento, ponderando sobre os limites entre os dois conceitos e convidou os presentes a abraçar a luta contra os estereótipos femininos repercutidos socialmente, além de exprimir seu desejo de viver em uma sociedade mais justa e igualitária para homens e mulheres. “Precisamos nos esforçar o máximo possível para a gente ter esse ambiente de igualdade, fraternidade, sororidade. Não de polarização, não de guerra entre os sexos, porque disso o mundo tá cheio, mas que a gente possa cada vez mais contribuir para uma sociedade mais justa e igualitária”.
Campanha Agosto Lilás
A palestra faz parte das ações de enfrentamento da violência doméstica e que marca a campanha nacional Agosto Lilás no Judiciário Trabalhista da 16ª Região. Agosto Lilás é uma campanha nacional que mobiliza instituições e sociedade na luta pela igualdade de gênero. A campanha celebra o aniversário da sanção da Lei Federal nº 11.340/2016, a chamada Lei Maria da Penha, que criou mecanismos para prevenir e coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher em conformidade com a Constituição Federal (artigo 226, parágrafo 8°) e os tratados internacionais ratificados pelo Estado brasileiro (Convenção de Belém do Pará, Pacto de San José da Costa Rica, Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem e Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher), conforme o Instituto Maria da Penha.