Judiciário e Ministério Público recebem denúncias de exploração do trabalho infantil em Codó
As denúncias foram apresentadas durante a presença da Caravana da Liberdade no município
No último dia da Caravana da Liberdade em Codó, nesta quinta-feira (22), lideranças comunitárias apresentaramà Justiça do Trabalho, Ministério Público do Trabalho e Ministério Público Estadual, várias denúncias de exploração da mão de obra infantil no município. São situações de crianças e adolescentestrabalhando em oficinas mecânicas, borracharias, lava-jatos, dentre outros locais, inclusive no horário da noite. O Conselho Tutelar relatou o caso de um adolescente que apanhou de palmatória do patrão. Os relatos ocorreram durante debate sobre o tema, realizado no auditório do Tribunal do Júri da cidade, pela manhã.
Para a juíza titular da Vara do Trabalho de Caxias, Maria do Socorro Almeida, não há dignidade do trabalho infantil como ainda acreditam muitas pessoas. “Não é normal acreditar que nossas crianças, que deveriam estar estudando e brincando, estejam trabalhando em carvoarias, lavoura e nas casas de família cuidando de outras crianças”, afirmou. A magistrada ressaltou que a Caravana da Liberdade combate é esse trabalho que lança nas costas da criança e do adolescente uma responsabilidade que é dos adultos.
A procuradora do Trabalho Virgínia Azevedo Neves Saldanha disse que as denúncias serão formalizadas e apuradas. “Estamos nessa caravana para receber as denúncias”, garantiu. A representante do Ministério Público afirmou que o trabalho infantil é cruel porque define o futuro da criança e do adolescente e estabelece que a criança pobre deve ser excluída. “Viola de uma vez só seus direitos básicos fundamentais”, acrescentou.
Os principais casos denunciados pelas lideranças comunitárias de Codó foram referentes à utilização de crianças e adolescentesno serviço chamado de “bate-pneu”, uma prática comum em locais próximos a postos de combustíveis e postos de fiscalização, que concentram borracharias e grande números de caminhões. As crianças são usadas para bater os pneus de caminhões e verificar a calibração, um trabalho que além de ser pesado também coloca em risco a vida desses menores, conforme denunciou o Conselho Tutelar. A presença das crianças, segundo os conselheiros, ocorre na localidadeKm 17, entrada do município de Codó.
O Conselho Tutelar denunciou também que conselheiros são ameaçados para não denunciarem situações de exploração de crianças e adolescentes e ocorreu de conselheirose ausentar da cidade por um período, devido a ameaças de morte. “Também precisamos de proteção”, afirmou uma conselheira.
O presidente da Associação de Moradores da Comunidade Quilombola Cipoal dos Pretos, Severa da Conceição,reclamou da falta de escola pública na comunidade, que fica 64km da área urbana de Codó. A única escola funciona em uma casa de taipa e coberta de palha e atende 45 crianças, na comunidade em que vivem 26 famílias.
Situaçãosemelhante passam outras oito comunidades da área rural , onde moram 378 famílias. Juvenal Rodrigues,presidente da Associação dos Produtores Rurais de Tuturubá, distante 18km da cidade de Codó, disse que foi vítima ao mesmo tempo do trabalho infantil e do trabalho escravo. “Trabalho desde os oito anosna lavoura e nunca tive acesso a nada”, desabafou. Ele contouque a história se repete naquelas comunidades onde as crianças são transportadas para a escola em garupas de bicicletas ou motocicletas porque não há transporte escolar.Segundo ele, só há uma escola municipal para atender as oito comunidades e as demais escolas são comunitárias.
O juiz titular da Vara do Trabalho de Bacabal, Bruno de Carvalho Motejunas, defendeu, durante o debate sobre trabalho infantil, que é preciso responsabilizar também o gestor municipal e não apenas o município como ente público.
Para o promotor de Justiça e coordenador do Centro de Apoio da Criança e do Adolescenteda Procuradoria Geral de Justiça do Maranhão, Márcio Tadeu Marques, o combate à exploração do trabalho infantil não pode ter uma linha única de enfrentamento. Conforme o promotor, o trabalho infantil não deve merecer a anuência tácita da sociedadee que,tão importante quanto a fiscalização e o seu enfrentamento, é a busca de soluções institucionais para isso. Ele disse que a sociedade civil também deve se organizar e exigir dos gestores municipais a criação de políticas púbicas efetivas de atendimento à criança e ao adolescente. “Entendo que com essa caravana, tanto o trabalho infantil quanto o trabalho escravo passarão a ter uma inclusão na pauta de discussão das organizações sociais do município de Codó”,disse. “Não podemos permitir que esse círculo de trabalho infantil se perpetue”, concluiu o promotor.
A Caravana da Liberdade é um projeto de prevenção e repressão ao trabalho escravo e trabalho infantil e que conta também com atividades de cidadania que incluem emissão de documentos, palestras e oficinas. Codó é o primeiro município a receber a caravana.
É uma iniciativa do Tribunal Regional do Trabalho do Maranhão e Ministério Público do Trabalho, em parceria com o Governo do Estado, através das secretarias de Direitos Humanos e Cidadania, Trabalho e Emprego e Igualdade Racial. Conta ainda com uma rede formada pelo Tribunal de Justiça do Maranhão, Incra, Procon, Defensoria Pública, Ministério Público Federal, Superintendência Regional do Trabalho e Emprego, SINE, Senai, Senac, Polícia Rodoviária Federal, Centro de Referencia em Saúde do Trabalhador da Secretaria Estadual de Saúde, ONG Plan, Repórter Brasil e Centro de Defesa da Vida e dos Direitos Humanos de Açailândia