Discurso de Posse de Alcebíades Tavares Dantas no cargo de Presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 16ª Região - Maranhão

Esta data tem para o Tribunal Regional do Trabalho um significado especial. Ela permite mudanças, renovações, transformação, troca de experiências e, sobretudo, vem abrir novas esperanças.

Participo deste momento com humildade e com o coração cheio de agradecimento para com todos os que depositaram em mim sua confiança. Não tenho mágoas e não guardo ressentimentos de qualquer espécie, no coração. Guardo no coração as palavras de Leão XII, segundo as quais, a concórdia traz consigo ordem e beleza. Do conflito perpétuo não pode resultar senão confusão e luta selvagem.

Assumo a direção deste Tribunal, mas não com o objetivo de “status” pessoal ou de honraria que sempre são transitórias. Não busquei este poder, que veio como um de poder de serviço, como uma oportunidade de trabalhar por este país, por este Estado, como um ônus, como uma oportunidade de servir.

Tenho clara consciência das novas responsabilidades, das dificuldades existentes, assim como das tarefas que deverão ser cumpridas. Os Juízes que me antecederam na Presidência contribuíram com suas experiências para levantar este Tribunal nos momentos mais difíceis e hoje Discurso de Posse do Juiz Alcebíades Tavares Dantas, como Presidente do TRT em 28/6/94. Vejo que aplainaram e preparam o caminho para que a obra seja ampliada. A marca das suas obras pode ser vista nesta casa.

Este Tribunal pertence ao povo. É uma instituição a serviço do Estado e de sua sociedade. Tenho o dever de trabalhar com o melhor dos meus esforços para torná-lo uma instituição digna do respeito e da admiração do povo, visando tão somente o interesse público, para que possa cumprir a missão para a qual foi criado.

Qualquer ato menor, qualquer conflito, qualquer mudança de direção que possam levar-nos e levá-lo a se afastar do seu destino é fruto de fraqueza humana e do erro. Portanto, devem ser afastados.Há muitos anos atrás, quando assumi o cargo de Juiz Substituto do Trabalho, fiz uma prece silenciosa pedindo a Deus o seu auxílio e a sua proteção nas novas funções que assumia.

Anos depois quis Deus, que na solenidade de instalação, volvesse novamente os meus pensamentos para ele pedir que tomasse o Tribunal sobre sua proteção. Hoje, mais uma vez, dando continuidade a um ritual que integra a minha vida, volto meus pensamentos e voz para renovar à Deus os pedidos de sabedoria, guinada e auxílio. Sei que Ele não me faltará ou se fará omisso.

Peço, também, aos juízes que compõem o Tribunal o seu auxílio, a ajuda da experiência e o conhecimento de que são detentores. Somos os artífices encarregados da obra e em nossas mãos estão às responsabilidades, as tarefas árduas da construção e, nunca as de destruidores da coisa pública.

Permitam-me, neste momento solene e quando participo deste momento sem o convívio de entes queridos que estão impossibilitados de se fazerem presentes, para agradecer-lhes a caminhada juntos e tudo que fizeram e tudo quanto me deram.

Permitam-me, também, dirigir-me aos magistrados da Região que fizeram a escolha de assumir pesadas e grandes responsabilidades. Indago se estamos à altura das tarefas que buscamos se para elas nos preparamos diuturnamente e se empregamos toda a diligência, todo o domínio próprio, toda a virtude, toda a ciência. Continuamente indago se corremos o risco de sermos tidos como infrutíferos ou seres de obras injustas e concluo que jamais podemos estar prontos para a tarefa gigantesca da justiça. Olho a jornada percorrida e vejo-a com olhos de aprendiz, agradecendo à vida a oportunidade de servir.

Observo que o homem não pode criar valores e vejo e concluo que não podemos estar prontos porque o homem não pode criar valores. Se pudesse, os valores do traficante seriam tão legítimos e valiosos quanto os outros valores criados. Não podemos estar prontos porque não temos a capacidade de restabelecer à justiça. Mourejamos nos limites da lei e do direito, tateamos na busca do conceito do justo, erigindo uma ciência baseada na lógica, este fruto de uma razão limitada e ela mesmo prisioneira.

Nós magistrados, não nos podemos tronar aceitáveis aos olhos dos homens e de Deus quando não cumprimos nossos deveres por desleixo, paixão, fraqueza moral, quando nos tornamos insensíveis para os problemas daqueles que buscam o nosso auxílio. 

Não é aceitável o despreparo dos que buscaram e escolheram tão honrosa missão, assim como não o é deixar-se envolver pelo facciosismo, pelo julgamento superficial, pelo julgamento apressado e por atitudes que levam à perda de imparcialidade, imparcialidade que e o instrumento de proteção e auxílio na dura guerra dos conflitos em que se debatem interesses e pretensões.

A justiça não pode ser corrompida, não pode ser paralisada pela inércia dos juízes, inércia esta que e a característica das pedras e não da vida que lateja no coração dos seres humanos. Também não pode ser paralisada com o aumento assustador do volume de processos e se serviços, estes frutos da desordem do plano material, desordem geradora de novos e devastadores efeitos, efeitos que vão gerar novas causas, causas destrutivas.

É chegando o momento de nos debruçarmos sobre as causas e não sobre efeitos. É chegado o momento de gerar novas e diferentes causas para que possamos obter efeitos diferentes. Perdoem-me por fazer ecoar, agora, neste recinto, e se possível nas suas calçadas com pedras de cantaria ou vestidas de asfalto, que unem o velho e o novo, nas casas coloniais que refletem a grandeza deste povo e a generosidade da alma maranhense, as palavras do Padre Antônio Vieira, cuja vida e serviço estão associados à nossa terra, terra que agora também é minha por adoção, por escolha de amor.

Deixem-me fazer ecoar as palavras do peregrino brador do escritor colonizador, do colonizador de Cristo, que veio assentar os alicerces das nossas origens e do nosso destino, quando dizia: “a doutrina que eles desestimam, essa é a que lhe devemos pregar, e por isso mesmo, porque é a mais proveitosa a que mais hão mister. E mais hão mister porque o trigo que caiu no caminho pisaram-no os homens”. A doutrina que os homens desprezam essa é a que devemos pregar, porque é a que nos põe no caminho.

Almejaria pregar o que no pode pôr no caminho. Pregar nas mentes e corações a doutrina que caísse como a chuva do céu, e como o orvalho se destilasse brandamente fazendo germinar nos corações novos caminhos que afastem as dificuldades e a de desordem, e de fazer germinar a luz, a paz, a concórdia.


Repetindo Vieira digo: “Ai de mim se não disser o que convém, porque a cima dos tribunais dos anjos está à tribuna e o Tribunal de Deus que nos julgará”. É preciso dizer o que convém porque fechamos nossos ouvidos à verdade e abri-mo-os as fábulas, aos pensamentos aéreos e sem fundamento de verdade, porque o trigo que caiu do céu foi pisado e não geminou.

Há muito a dizer e tão pequeno é o tempo, mas não impróprio o lugar porque é preciso bradar que nossos erros procedem da ignorância, da má-vontade, da rebelião contra as leis da vida. É preciso bradar que somos os criadores da discórdia e da desordem sobre o nosso planeta e é preciso reparar, deixar de correr para a decadência, é preciso fazer cessar a corrupção, restabelecer a ética, corrigir as injustiças, pois o bem e o mal praticado concerne a todos.

Há muitos anos e no momento em que vim morar em São Luís vejo, às minhas mãos o ensinamento de Deus para o povo judeu que ia cativo para a Babilônia: diga ao povo para trabalhar para a paz e a prosperidade da terra para onde serão levados e La terão paz e prosperidade. O mandamento, pois é trabalhar para a paz, trabalhar para a prosperidade da terra onde estamos. Como poderemos ter prosperidade sem trabalho. Como podemos ter paz sem trabalho?.

É num quadro de carência morais e econômicas, de desordem, de destruição dos valores éticos, que os juízes devem crescer em responsabilidades, evitando decisões fracas, ou temerárias, arbitrárias ou injustas ou que perpetuem conflitos ao invés de dirimi-los.

Embora a consciência de cada juiz dependa da sua formação técnica e filosófica, abrangendo-lhe a cultura jurídica, a visão política, econômica, social, moral, religiosa, formação que provoca enorme diversidade e às vezes decisões aparentemente divergentes, para as mesmas questões, mas que explicam as discrepâncias nos colegiados de jurisdição ordinária e extraordinária, não podemos ceder a tentação de ganhar notoriedade ou de suscitar polêmica para obter destaque pessoal ou mesmo falhar no dever de manter conduta irrepreensível na vida pública e particular.

Aos não vocacionados permitam-me lembrar o ensinamento do Min. Sidney Sanches de que a formação do juiz deve servir de exemplo para a sociedade a que servem e do qual podem se orgulhar. Aos magistrados do trabalho desta região renovo estas lembranças e reitero o pedido de colaboração já que temos o compromisso de zelar pelo prestígio da justiça, pela dignidade da função, não como atributo pessoal ou para ostentar força ou prestígio, mas para que a justiça seja querida, amada e respeitada pelo povo.

Vivendo em tempos em que o irracionalismo nos oprime quais a desrazão travestida de razão imperam, nos quais nos tronamos vulneráveis ao irracional e ainda nos quais as razões do Estado ou a razão econômica sustentam os desvãos do autoritarismo, devemos observar que é o irracionalismo que oprime.


O poder ilegítimo não se localiza apenas no estado tirânico, mas também na sociedade, em que ele se tornou invisível, difuso, aprisionando o indivíduo em suas malhas tão seguradamente como na época da monarquia absoluta ou na escravidão.

É preciso combater em todas as instâncias tudo o que oprime o ser humano, tudo o que impede a sua plena maioridade, maioridade que não se mede ou não se percebe sem saber quão o destino do ser humano ou as razões pelas quais foi colocado na terra.

Os que lidam com o direito e com a justiça, muito mais com a justiça do que com direito, e aqui não me refiro só aos juízes, advogados, legisladores, mas todos os que aplicam o direito ou o subvertem, todos, repito, tem uma tarefa gigantesca de colocar ordem ou desordem, implantar liberdade onde existe opressão restabelecer a justiça onde impera a injustiça, proteger os fracos contra a opressão dos fortes, retirar da sociedade os poderes tirânicos, obscuros e ilegítimos que aprisionam os homens.

Para tanto precisamos usar de sabedoria, de criatividade, de amor, de poder, dos cuidados e da diligência necessários. Não podemos fracassar nestas tarefas ou nas de reordenação de todas as atividades administrativas e jurisdicionais que forem necessárias e, por isto, lhes peço que afastem dos corações tudo que possa impedir o trabalho de construir e servir.

Desejo também dirigir-me aos servidores. Sei que me preocupam com questões relacionadas com requisições e gratificações e julgo ser do meu dever fixar, como necessário, a orientação que impeça o descrédito do Tribunal como instituição, corrija ilegalidades porventura existentes, minimize injustiças e, sobretudo, preserve o respeito às autoridades e aos funcionários nas aspirações e interesses legítimos, com como o respeito para os que, oriundos de outros órgãos, têm prestado colaboração e ajudado a suprir a carência de funcionários.

Desejo também dirigir-me aos empresários maranhenses para lhes dizer que a geração de riquezas é necessária para tirar o nosso povo do atraso e da miséria. A riqueza, contudo, é fruto do trabalho, mas a paz é fruto da justiça. Não pode haver paz nas relações sociais sem justiça e sem riqueza. Não pode haver prosperidade com a destruição das empresas ou na desordem, econômica ou com desemprego.

A miséria não é um castigo, mas é também fruto da ignorância e por isso devemos rejeitá-la como indigna do homem. A geração das riquezas, no entanto, deve ser posta a serviço do homem. Aos trabalhadores lembramos os deveres social, familiar e pessoal. A justa luta por melhores condições de vida não pode ser travada com a destruição das fontes de sustento ou sem limites e sem respeito. Ela tem limites éticos, sociais e econômicos.

Os limites econômicos são postos pelas dificuldades existentes e da própria capacidade que tem as empresas. Os sociais, por sua vez, são postos por todos aqueles que sofrem os impactos das lutas trabalhistas, muitas vezes vítimas passiva que suportem os ônus que poderiam ser evitados. Já os limites éticos não permitem a riqueza incomensurável de um lado e a pobreza absoluta de outro, ou mesmo a riqueza construída sem atender as necessidades dos que ajudam a erigi-las, ou mesmo supressão dos valores que dignificam o homem.


Por fim, quero agradecer aos Presidentes de tribunais do Trabalho, Desembargadores e autoridades, aos amigos e servidores que nos honram com suas presenças.

Agradecer por virem partilhar e dar maior brilho à este momento.

Muito Obrigado.

Alcebíades Tavares Dantas

 

Data: 26 de junho de 1993

Revista do TRT 16ª Região - Volume 2 - Julho/1993 a Junho/1994

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