História do Poder Judiciário
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No Brasil, as instituições judiciárias remontam aos primeiros anos de colonização portuguesa no continente americano. A expedição de Martim Afonso de Sousa, partida de Lisboa em 1530, marcou importante transição, pois, como capitão-mor da frota, foi investido de amplos poderes judiciais, tendo-lhe sido concedida plena autoridade legal em todos os casos civis e criminais, de modo que esses poderes estendiam-se aos membros da expedição
e a todas pessoas do Brasil (SCHWARTZ, 2011).
A Justiça colonial reproduzia as formas portuguesas, sendo uma espécie de Justiça real. Desde o século XIII, na Europa, a Justiça era um importante atributo do rei. Não havendo ainda a clássica teoria da tripartição de poderes de Montesquieu, o Estado era um amálgama de funções ao redor do rei, de modo que a Justiça real absorvia atividades políticas e administrativas ao mesmo tempo em que coexistia com outras jurisdições como a eclesiástica (WEHLING, 2004; BÖTTCHER, 2020a).
O pelourinho, símbolo da justiça e autoridade real, ficava no coração da
maioria das cidades portuguesas do século XVI. À sua sombra, autoridades
civis liam proclamações e castigavam criminosos. Sua localização no centro
da comunidade refletia a crença ibérica de que a administração da justiça
era o mais importante atributo do governo. Os portugueses e espanhóis
dos séculos XVI e XVII achavam que a aplicação imparcial da lei e o honesto
desempenho dos deveres públicos garantiam o bem-estar e o progresso do
reino (SCHWARTZ, 2011, p. 27).
Inicialmente, juízes ordinários, almotacés, vereadores e demais funcionários eram designados pelos donatários das Capitanias hereditárias. Mais tarde, com as Governadorias gerais, a Justiça foi estruturada em três instâncias, de acordo com as Ordenações Filipinas. Como segunda instância, foram instalados os Tribunais de Relação da Bahia, em 1609, e do Rio de Janeiro, em 1751. Acima desses Tribunais, estavam o Desembargo do Paço de Lisboa e as Juntas das Capitanias (SADEK, 2010).
Durante os séculos XVI a XVIII, foram criadas as primeiras Comarcas nas seguintes sedes: Salvador (1548), Rio de Janeiro (1608), São Luís (1619), Belém (1652), Olinda (1653), Nossa Senhora das Neves (1688), São Cristóvão (1696), São Paulo (1700), Santa Maria Madalena (1709), Vila Rica (1711), Sabará (1711), São João del-Rei (1713), Vila do Príncipe (1720), Mocha (1722), Paranaguá (1723), Aquiraz (1723), Vila do Bom Jesus de Cuiabá (1728), Vitória (1732), Vila Boa de Goiás (1733), Santo Antônio (1734), Santa Catarina (1749), Cairu (1763) e Porto Seguro (1763) (CUNHA; NUNES, 2016).
No século XIX, porém, as estruturas das instituições judiciárias na América portuguesa, e mais tarde no Brasil independente, enfrentaram profundas mudanças.
Com a vinda da família real portuguesa para o Brasil em 1808, a Relação do Rio de Janeiro foi transformada em Casa da Suplicação pelo Alvará régio de 10 de maio daquele ano, equiparado hierarquicamente à Casa de Suplicação de Lisboa. Pela importância da data para a história da Justiça brasileira, já que esse Tribunal representou uma espécie de “independência judiciária” do Brasil em relação a Portugal, a data de 10 de maio tornou-se o Dia da Memória do Poder Judiciário, nos termos da Resolução CNJ n. 316/2020.
Após a independência brasileira em 1822, a Constituição do Império, outorgada em 1824, regulamentou o Supremo Tribunal de Justiça e determinou a criação de Tribunais de Relação para o julgamento das causas em segunda instância. Por essa Constituição, o Poder Judiciário era submetido ao rigor do Poder Moderador do Imperador, ao passo que o Supremo Tribunal de Justiça não detinha, até o ano de 1875, competência para revisar os julgados dos Tribunais da Relação das províncias ampliados a partir de 1873.
Proclamada a República em 1889, a Justiça Federal foi criada em 1890 e a Constituição de 1891 instituiu o sistema federativo, ratificando-a na nova estrutura judicial. Em sua maioria, a então organização judiciária provincial foi mantida, não tendo a Constituição republicana previsto, expressamente, a instituição dos tribunais estaduais, pois se entendia que cada unidade da Federação tinha autonomia para disciplinar o próprio Poder Judiciário, ensejando a criação da maior parte dos atuais Tribunais de Justiça dos estados, que tiveram denominações variadas.
Nessa esteira, durante o século XX, aconteceram importantes modificações na estrutura das instituições judiciárias brasileiras. A Constituição de 1934 criou novos órgãos especializados: a Justiça Eleitoral; a Justiça do Trabalho, como órgão administrativo e ainda não integrante do Poder Judiciário; Justiça Militar, como integrante ao Judiciário. Essa mesma Constituição criou a carreira da Magistratura estadual, tornou obrigatório o concurso para ingresso, regulou o acesso dos magistrados às entrâncias e instâncias e concedeu ao Tribunal a prerrogativa de propor alterações no número de juízes e em sua organização interna (SADEK, 2010).
Contudo, com o advento do Estado Novo e a outorga da Constituição de 1937, foram extintas as Justiças Federal e Eleitoral, instituindo-se o controle político sobre os membros do Judiciário, tendo sido concedido ao chefe do Executivo o poder de nomear o presidente do Supremo Tribunal Federal.
Em 1946, com a redemocratização do país, a nova Constituição reintroduziu a Justiça Eleitoral, integrou a Justiça do Trabalho ao Poder Judiciário e criou o Tribunal Federal de Recursos. Sem uma Justiça Federal de primeira instância, os juízes estaduais submetiam suas decisões a dois tribunais: o Tribunal de Justiça ou o Tribunal Federal de Recursos, conforme a matéria de competência.
Durante o período militar de 1964 a 1985, as instituições judiciárias foram alteradas por meio da Constituição de 1967 e emendas constitucionais de 1969 e de 1977, destacando-se a recriação da Justiça Federal, em 1965.
A redemocratização do país e a promulgação da Constituição de 1988 asseguraram, novamente, a autonomia administrativa e financeira do Poder Judiciário. A partir de então, criaram-se o Superior Tribunal de Justiça, que assumiu parte das funções antes atribuídas ao extinto Tribunal Federal de Recursos e os Tribunais Regionais Federais.
Pela Lei n. 9.099/1995, foram criados os Juizados Especiais Cíveis e Criminais, que substituíram os Juizados de Pequenas Causas, representando importante forma de acesso do cidadão à justiça, ampliada para a Justiça Federal pela Lei n. 10.259/2001.
Conforme visto, a Emenda Constitucional n. 45/2004 criou o CNJ, órgão de controle administrativo do Poder Judiciário Nacional.
Fonte: Manual de Gestão da Memória do Poder Judiciário - Página 88 a 90